Dormidas

No Cais do Sodré um sem-abrigo dormita de mão estendida. O braço direito esticado e apoiado sobre o joelho.

Um boné sebento na mão diz a quem passa: “Dêem qualquer coisinha”.

Dormita, porque é difícil manter os olhos abertos à indiferença humana.

Na esquina da rua, uma porta diz a quem passa: “Dormidas”.

Em frente da porta, uma mulher anda de um lado para o outro como uma sentinela à entrada de um quartel.

Quando passa um homem sem ouvir o que diz o boné mas conseguindo ler o que diz a porta, ela entra com ele, e depois a janela do primeiro andar fecha-se.

Passados alguns minutos ela vem depositar uma moeda no boné.

E por uns segundos o sem-abrigo abre os olhos para uma réstia de humanidade.

Publicado por

Manuel Bastos